Inclusão Social e os desafios para os surdos no ensino superior

Dos mais de 10,7 milhões de deficientes auditivos no Brasil, apenas 7% têm diploma de graduação
Em 19/10/2020 10h18 , atualizado em 19/10/2020 10h41 Por Lorraine Vilela Campos

Jéssica desenvolveu glossário em Libras com ajuda de intérprete - Crédito da Foto: Faculdade Pitágoras
Jéssica desenvolveu glossário em Libras com ajuda de intérprete - Crédito da Foto: Faculdade Pitágoras
Crédito da Imagem: Faculdade Pitágoras
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A educação é fator fundamental para a inclusão social e, apesar dos avanços nas últimas décadas, pessoas com deficiência ainda encontram barreiras para estudar. Das 10,7 milhões de pessoas com deficiência auditiva no Brasil, apenas 7% têm ensino superior completo, 15% estudaram até o ensino médio, 46% frequentaram até o fundamental e 32% não têm nenhum grau de instrução. 

Veja também: Língua Brasileira de Sinais (Libras)

Em relação aos estudantes matriculados no ensino superior, o último levantamento do Ministério da Educação (MEC) identificou 5.978 pessoas com deficiência auditiva, 2.235 com surdez e 132 com surdocegueira. A vida em sociedade é muito voltada para o cidadão ouvinte e o desconhecimento da Língua Brasileira de Sinais (Libras) é uma das principais dificuldades encontradas no convívio social.

Apesar de ser a segunda língua oficial do Brasil, são poucos os professores que sabem Libras, o que dificulta a interação com os alunos surdos ou com alguma deficiência auditiva, já que há grande foco na oralidade e no Português escrito durante as aulas, restando ao surdo acompanhar a tradução do conteúdo pelo intérprete de Libras. 

A saída para uma maior integração do estudante surdo com o ambiente escolar é a formação bilíngue do educador. O ensino básico conta com algumas escolas bilíngues, em que o professor dá aulas em Libras ao invés de contar com o apoio do intéprete, mas ainda são poucas e estão nos grandes centros urbanos. 

Adaptação

Surda de nascença, Jéssica Campos integra a pequena parcela de pessoas com deficiência auditiva com diploma de ensino superior. A maranhense de 29 anos se formou recentemente no curso de Tecnologia em Estética e Cosmetologia, na Faculdade Pitágoras de São Luís. 

Mesmo fluente em Libras (língua que aprendeu aos 9 anos) e da presença do intérprete nas aulas, Jéssica ainda encontrou alguns desafios em sua trajetória acadêmica, já que algumas palavras de seu curso não fazem parte da Língua Brasileira de Sinais. Ao se deparar com tal dificuldade, ela deficidiu criar o glossário de Estética e Cosmética com o auxílio de Rian Arouche, tradutor e intérprete de Libras . "Foi o melhor caminho para que eu pudesse me apropriar dos conceitos e termos técnicos utilizados", ressalta.

O glossário será mais uma ferramenta de estudo acessível disponível para os demais estudantes surdos da faculdade. “A Jéssica, sem dúvida, é uma inspiração para todos nós, seja pela criatividade ou pela proatividade em lidar com os desafios. Ela realizou um feito que ajudará muitas pessoas a entenderem que há lugar para todos no mercado de trabalho, na faculdade e onde quiserem”, afirma a coordenadora do curso de Estética da Faculdade Pitágoras, Patrícia Crosara.   

Oportunidades

Principal forma de ingresso no ensino superior público, o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2020 recebeu mais de 5,1 milhões de inscrições. Do total de inscritos, 2.487 têm alguma deficiência auditiva, 1.353 são surdos e 134 possuem surdocegueira, pessoas que puderam solicitar recursos de acessibilidade para a realização das provas. Somando participantes com alguma deficiência (visual, auditiva, intelectual ou física), gestantes, lactantes e idosos, foram registrados mais de 52 mil solicitações de atendimento especializado

A alta busca pelo atendimento especializado no Enem mostra a necessidade de acessibilidade para que as pessoas com deficiência possam fazer um curso superior. É comum a desistência da vida acadêmica pelo sentimento de exclusão, cenário que precisa ser mudado para que o direito à educação seja efetivamente cumprido. 

A importância da Educação para a inclusão social é algo que Jéssica constata na prática. A esteticista está com seu sonho em andamento, o Librastetic, esmalteria e estúdio de beleza acessível para pessoas com diferentes tipos de deficiência. "Ao refletir sobre o ensino de estética para todos, estamos tratando as pessoas com deficiência como consumidores, pacientes, alunos e, principalmente, como cidadãos", ressalta.