Menino de engenho

Professora de Literatura analisa o livro O Menino de Engenho
Crédito da Imagem: Brasil Escola

Carlinhos com apenas quatro anos acordou em uma manhã com um grande barulho em sua casa, encontrou sua mãe largada sobre o chão coberta de sangue e seu pai como um louco a chorar sobre ela. Ele tentou se aproximar da mãe morta, mas o tumulto de empregados e a chegada dos policiais que fecharam o quarto pondo todos pra fora o impediu. Um dos empregados comentou que havia visto o senhor com uma arma na mão e a senhora no chão.

O pai de Carlinhos vivia entre transtornos e a mãe dele sofria com as grandes explosões do marido. Porém logo ele, entre lágrimas, se arrependia e era perdoado. A mãe, Clarisse era doce, meiga, um anjo. Depois de tal catástrofe o pai de Carlinhos foi levado preso e em um abraço doloroso se despediu do filho. Após alguns dias ele foi levado para a fazenda do avô.

Assim que chegou à fazenda da qual sua mãe já havia falado inúmeras vezes descrevendo-a como um paraíso, mas nunca tinham ido devido a díficil relação entre o seu avô e seu pai, foi recebido alegremente. Todos queriam ver o menino de Clarisse. Tia Maria, a irmã mais nova de sua mãe tomou lhe como um filho.

Na fazenda de Santa Rosa conheceu o engenho, as plantações de cana, a maquinaria toda do lugar que o encantou. Fez amizades com os primos e passava o dia pela fazenda brincando na lama, fazendo travessuras e nadando no rio. Juntos, eles odiavam a Sinhazinha que levava a chave da despensa e guardava todas as frutas e doces, vendo muitos perdedrem.

Carlinhos fez-se amigo de Lili uma prima sua, a menina era loirinha de olhos azuis e uma brancura sem igual. Era doente. Ele e Lili tornaram-se amigos e ele prefiria ficar com ela do que com os primos em travessuras. Um dia a menina amanheceu vomitando negro, chamou Carlinhos. Entretando logo o tiraram do quarto. Lili morreu.

Ele e os primos se alegravam com as idas à outros engenhos, e com as visitas. O avô muitas vezes o levava junto a caminhadas pela sua grandiosa terra. Com a chegada do inverno veio a cheia do rio, esperaram muito por ela e quando chegou foi forte, talvez a mais forte que já se teve. Negros morreram, animais também e casas foram destruídas. Santa Rosa foi atingida, Tia Maria com algumas negras e as crianças se instalaram por esses tempos em uma das fazendas vizinhas.

Ela tentava ensinar as letras ao sobrinho, no entanto ele não aprendia, até que foi mandado à um mestre, lá era tratado diferente dos demais, afinal era o neto do coronel José Paulino. Foi lá que teve sua primeira paixão, a mulher do mestre era como outra mãe e lhe ensinava entre abraços e beijos. Assim ele aprendeu as letras. Depois foi levado para outro mestre, o rapaz que o levava lhe iniciou as aulas falando sobre as coisas erradas do mundo.

O menino ia vivendo no engenho e muitas vezes se isolava, caçava canários que deixava presos e enquanto os esperava vivia acompanhado da solidão. Depois de muita chateaçãoganhou um carneiro para montar e ainda com a mesma tática ganhou a sela e as rédeas. Chamava-se Jasmin, era sua nova paixão banhava-o com sabonete e lhe penteava a lã, saía pela fazenda cavalgando, ia à casa dos empregados da fazenda e brincava com os filhos deles.

Carlinhos amava também as histórias de Totonha, por vezes ela passava pelo engenho e contava grandes histórias com uma esplendorosa interpretação que encantava o menino. Ainda ele ia à senzala onde conversava com os negros. Lá vivia uma negra vinda da Angola que todos tinham como uma vovó, mas tinha também uma vinda de Moçambique que aterrorisava-o. O menino também temia o lobisomem e as histórias relaionadas a ele. E como ali a religião não era algo muito presente, o menino desconhecia Deus e sua palavra, sabia o pouco que a mãe lhe ensinara.

Teve sua segunda paixão quando vieram umas primas do Recife, fez amigo de uma delas, era a mais velha. Ficavam nas sombras dos cajuzeiros e ela lhe contava histórias sobre viagens em navios as quais ele temia e ele contava histórias como a da cheia e de um incêndio que certa vez atingira a fazenda. Um dia lhe deu um beijo, depois correu de volta para a casa grande, no jantar olhavam-se, e foi assim até que a prima foi embora sem a menor tristeza, magoando-o.

O tio Juca, depois de ter engravidado um negra, ficava sempre no quarto, recebia ali Carlinhos com quem aceitava maiores intimidades, quando ele se ausentava do quarto deixando o menino só, ele corria as coisas do tio e ficava a ver as fotos de mulheres nuas que ele guradava. Um dia foi pego e o tio lhe cortou essa intimidade.

Certa vez ouviu a conversa do avô que falava sobre seu pai. O sanatório onde ele havia sido internado avisava que a família do homem havia parado de pagar e assim José Paulino tomou parte das contas. O menino passou a temer que um dia ficasse doido como o pai. A vinda de um médico à fazenda lhe decretou que era doente e que merecia um grande tratamento, o menino passou a ficar sempre dentro de casa privado do verão no quintal da fazenda, ganhava tudo que pedia, mas vivia prisioneiro. Os primos não brincavam mais com ele por que sempre levavam uma bronca por arrastarem o menino para o quintal e o sereno.

Restava-lhe apenas o passeio com Jasmim, mas tinha que voltar cedo. Nesses passeios brincava com os filhos dos empregados que não sabiam do zelo que tinham por ele na casa grande. Por esses tempos o casamento de Tia Maria foi marcado e aconteceu, novamente ele perdia uma mãe.

A vida presa que tinha ocasionou no menino um despertar mais cedo pelo sexo e assim se envolvia com tal coisa, sem medo do pecado da imoralização. Nesses dias mataram Jasmim, ele consentiu com a morte, o animal estava gordo e lhe dariam outro. Só lhe restava agora Zefa Cajá, uma negra e foi com ela que aos doze anos se tornou homem, com isso pegou uma “doença de homem” uma “doença do mundo”.

Inicialmente a escondeu e lutava contra ela, mas depois veio ao conhecimento dos moradores da casa grande, era motivo de riso. Primeiro não gostou, mas depois tinha orgulho da doença, agora era tratado diferente, quase como homem, os empregados falavam as coisas na frente dele e as conversas não paravam quando ele chegava. A perversão o invadia e ia ver as mulheres tomarem banho no rio que ao mesmo tempo em que o censuravam lhes agradava a curiosidade.

Desde o casamento de Tia Maria que o menino se preparava para ir pra escola. Calças, ciroulas, camisas novas e brancas estavam prontas. Fazia-se o enxoval de Carlos, a sua doença era tratada por Tio Juca e assim chegou o dia de ir para o internato. Foi, sabia que lá poderia ser o que a mãe desejara que fosse, foi seguindo o conselho do avô de dizia que estudando não se arrependeria. Chegou ao internato com a “alma mais velha que o corpo”, saudoso por paixões.