Lygia Fagundes Telles
Considerada como uma das mais engajadas escritoras da literatura brasileira, Lygia Fagundes Telles transita entre a realidade e o universo fantástico.
Por Marina Cabral da Silva“(...) Ouça, Virgínia, é preciso amar o inútil. Criar pombos sem pensar
em comê-los, plantar roseiras sem pensar em colher as rosas, escrever
sem pensar em publicar, fazer coisas assim, sem esperar nada em troca. A
distância mais curta entre dois pontos pode ser a linha reta, mas é nos
caminhos curvos que se encontram as melhores coisas (...)”.
O fragmento que você leu agora é parte de um dos mais aclamados livros da escritora Lygia Fagundes Telles. Ciranda de Pedra, publicado em 1954, é, ao lado de outros títulos como As meninas e Antes do baile verde, uma das mais consagradas peças da obra literária de Lygia, nome importante de nossa literatura brasileira.
Lygia Fagundes Telles nasceu no dia 19 de abril de 1923, na cidade de São Paulo. Filha de um advogado e de uma pianista, viveu em várias cidades do interior do estado natal em virtude da profissão do pai, um delegado e promotor público. O primeiro livro, Porão e Sobrado, reuniu contos escritos por uma Lygia de apenas quinze anos, mas já decidida a ser escritora. A paixão pela Literatura, embora tenha graduado-se em Direito e Educação Física na Universidade de São Paulo, sempre foi maior, tendo dedicado grande parte de sua vida à produção de seus romances e contos.
“Na realidade o amor é uma coisa tão simples... Veja-o como uma flor que nasce e morre em seguida porque tem que morrer. Nada de querer guardar a flor dentro de um livro, não existe nada mais triste no mundo do que fingir que há vida onde a vida acabou."
(Verão no aquário)
O livro de contos Praia Viva, publicado no ano de 1944, foi o livro de estreia da escritora e, embora o círculo literário da época fosse composto predominantemente por homens, Lygia ocupou seu espaço, estando presente nas rodas literárias e atenta aos acontecimentos políticos. Na vanguarda do feminismo, embora seja um equívoco rotular sua obra como feminista, a escritora, ao lado de Clarice Lispector, investigou o universo feminino sob uma perspectiva moderna: a mulher é figura central na obra da escritora e, por meio das técnicas do fluxo de consciência e do monólogo interior, fez delas as protagonistas de suas histórias.
“Mas não quero resposta, quero ficar só. Gosto muito das pessoas, mas essa necessidade voraz que às vezes me vem de me libertar de todos. Enriqueço na solidão: fico inteligente, graciosa e não esta feia ressentida que me olha do fundo do espelho. Ouço duzentas e noventa e nove vezes o mesmo disco, lembro poesias, dou piruetas, sonho, invento, abro todos os portões e quando vejo a alegria está instalada em mim.”
(As meninas)
Cronologicamente, Lygia Fagundes Telles é associada à geração modernista de 1945, tendo os escritores Rubem Braga, Dalton Trevisan, Clarice Lispector e Carlos Heitor Cony como contemporâneos. Além da temática feminina, considerada como um dos pontos altos de sua literatura, Lygia, influenciada pelo norte-americano Edgar Allan Poe, muitas vezes trilhou os caminhos surpreendentes e insólitos da literatura fantástica. Em algumas de suas histórias, vide os contos A caçada, Venha ver o pôr do sol e As formigas, fundiu a realidade do espaço urbano ao fantástico, ultrapassando a fronteira do real ao assumir uma tendência notadamente surrealista.
“(...)Quero te dizer que nós as criaturas humanas, vivemos muito (ou deixamos de viver) em função das imaginações geradas pelo nosso medo. Imaginamos consequências, censuras, sofrimentos que talvez não venham nunca e assim fugimos ao que é mais vital, mais profundo, mais vivo. A verdade, meu querido, é que a vida, o mundo dobra-se sempre às nossas decisões.(...)”
(As meninas)
Membro da Academia Brasileira de Letras desde 1987, quando ocupou a cadeira de número 16, Lygia recebeu diversos prêmios, entre eles o Jabuti — o mais importante prêmio da literatura brasileira — e, em reconhecimento à grande contribuição para o patrimônio literário e cultural da língua portuguesa, recebeu, em 1965, o Prêmio Camões, o mais importante da Literatura lusófona. Com mais de vinte livros publicados e traduzidos para diversos idiomas, Lygia é uma das mais engajadas escritoras da literatura brasileira.
Entre contos e romances, Lygia Fagundes Telles compôs uma das mais importantes obras da literatura brasileira
Principais obras de Lygia Fagundes Telles:
Porão e Sobrado, contos, 1938.
Praia Viva, contos, 1944.
O Cacto Vermelho, contos, 1949.
Ciranda de Pedra, romance, 1954.
Histórias do Desencontro, contos, 1958.
Verão no Aquário, romance, 1964.
Histórias Escolhidas, contos, 1964.
O Jardim Selvagem, contos, 1965.
Antes do Baile Verde, contos, 1970.
As Meninas, romance, 1973.
Seminário dos Ratos, contos, 1977.
Filhos Prodígios, contos, 1978.
A Disciplina do Amor, contos, 1980.
Mistérios, contos, 1981.
Venha Ver o Pôr do Sol e Outros Contos, 1987.
As Horas Nuas, romance, 1989.
A Noite Escura e Mais Eu, contos, 1995.
Biruta, contos, 2004.
Histórias de Mistérios, contos, 2004.
Conspiração de Nuvens, contos, 2007.
Passaporte para a China, contos, 2011.
*A imagem que ilustra este artigo é capa do periódico Cadernos de Literatura Brasileira, do Instituto Moreira Salles.
Por Luana Castro
Graduada em Letras