Debate sobre a terceirização do trabalho
A terceirização do trabalho é um tema que vem gerando certa repercussão em razão de sua possível liberação para todas as atividades produtivas de uma empresa
Um dos principais acontecimentos políticos desse primeiro semestre do ano de 2015 foi a emergência do debate sobre a terceirização do trabalho no Brasil, gerando uma série de opiniões tanto nos meios jornalísticos quanto nas redes sociais. Desse modo, muitas dúvidas surgiram sobre essa questão, tais como o conceito de terceirização, o que é o projeto de lei sobre o tema que está em votação, entre outras indagações.
O Brasil Escola organizou, então, um “bate-bola” com as principais questões sobre o tema. Ao final deste texto, temos algumas considerações sobre como esse tema poderá cair no Enem.
O que é terceirização?
A terceirização é a transferência de serviços e funcionários de uma empresa para outra. Tecnicamente, esse conceito é definido como um modelo de gestão e organização administrativa que permite que um determinado serviço seja executado por terceiros, que terão autonomia técnica e jurídica.
Exemplo: uma empresa “X” resolve demitir todos os funcionários responsáveis pela segurança de seus imóveis (porteiros, vigilantes etc.) e terceiriza essa função para uma empresa especializada nesse tipo de serviço. Os novos contratados para a função exercem as mesmas atividades, mas o patrão deles não é a empresa “X”, e sim a companhia terceirizada.
A terceirização é permitida no Brasil?
A prática da terceirização no Brasil é permitida, mas com ressalvas. Atualmente, ela só pode ser realizada para as chamadas atividades-meio, aquelas que não são diretamente relacionadas com o intuito principal das instituições. Já as chamadas atividades-fim não podem ser executadas por funcionários terceirizados.
Para entender melhor a diferença entre atividades-meio e atividades-fim, considere um exemplo de uma escola. O objetivo principal dela é oferecer educação escolar para os seus estudantes. Portanto, os profissionais diretamente ligados a essa função (professores, diretores, secretários, coordenadores pedagógicos etc.) exercem as atividades-fim. Já a equipe que cuida de funções não diretamente relacionadas, tais como limpeza, segurança e manutenção, são categorizadas como atividades-meio.
Se a terceirização é permitida, o que pretende o projeto de lei que tramita no Congresso Nacional?
O Projeto de Lei 4.330/2004 tem como objetivo principal regulamentar a prática da terceirização do Brasil a fim de sanar conflitos – sob o ponto de vista do esclarecimento de leis – no meio jurídico a respeito dessa questão.
O ponto principal e mais polêmico da proposta, no entanto, é a permissão para que as atividades-fim também possam ser terceirizadas. No exemplo da escola acima, os professores e pedagogos, por exemplo, poderiam ser contratados de uma empresa especializada em educação que não apresenta vínculos trabalhistas com a instituição; já as funções de secretaria poderiam ser executadas por outra empresa de gestão escolar e assim sucessivamente.
Por que os debates sobre a terceirização começaram a acontecer somente em 2015?
Na verdade, o debate sobre a terceirização do trabalho sempre ocorreu no Brasil. No entanto, ele tornou-se mais acirrado quando o Presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB/RJ), resgatou o PL4.330, proposto pelo ex-deputado Sandro Mabel (PSDB/GO) em 2004.
Por causa disso, as polêmicas sobre essa questão, tais como a permissão da terceirização para as atividades-fim, elevaram-se em razão dos rumores referentes à votação da pauta no Congresso. A proposta não só foi votada como também aprovada no dia 07 de abril, com 324 votos de deputados a favor, 137 contra e 2 abstenções. O projeto agora seguirá para o Senado.
Outra polêmica sobre o PL 4.330 relaciona-se com os concursos públicos, uma vez que o Estado também poderia terceirizar os serviços, o que acabaria com as vagas para efetivos. No entanto, essa questão gerou tanta repercussão que foi retirada pelos deputados, fazendo com que a terceirização integral aplique-se somente para empresas privadas, se ocorrer aprovação do projeto de lei.
O que dizem aqueles que são favoráveis ao projeto da terceirização?
Os defensores do PL 4.330 afirmam que o projeto é necessário para a total regulamentação da prática da terceirização no Brasil e para reduzir os conflitos jurídicos sobre o tema. Eles afirmam que não existe uma separação clara e concisa sobre o que seriam as atividades-meio e as atividades-fim e nem um ordenamento jurídico que oriente claramente essa questão.
Outro ponto defendido pelos favoráveis à extensão da terceirização para todas as atividades é que isso ampliaria a competitividade das empresas por considerarem que os ofícios seriam mais bem executados por empresas especializadas em cada função.
Eles ainda defendem que somente a empresa terceirizada possui vínculos e responsabilidades sobre os trabalhadores, mas, na PL 4.330, as questões referentes aos direitos dos trabalhadores e às condições de trabalho seriam de responsabilidade também da empresa contratante.
E o que dizem os grupos contrários ao projeto da terceirização?
A prática da terceirização sempre foi muito criticada por grupos de esquerda e organizações sindicais e trabalhistas por considerarem que essa prática gera uma redução dos ganhos da classe trabalhadora e amplia o processo de precarização do trabalho. Em geral, um trabalhador terceirizado recebe menos, trabalha mais e possui uma menor estabilidade no seu emprego do que um trabalhador diretamente contratado e que realiza a mesma função. E isso sem contar que o poder de negociação com os patrões – e até de greve – ficaria comprometido e de difícil realização.
Afirma-se também que poderá haver uma redução das vagas de trabalho, uma vez que a flexibilidade gerada pela terceirização costuma produzir menos contratações. Além disso, segundo estudos realizados pelo Dieese, um empregado terceirizado trabalha, em média, três horas a mais do que os outros. Portanto, o aumento da jornada de trabalho reduziria, em tese, o número de vagas disponíveis.
Outras afirmações passam pelas estatísticas a respeito da terceirização, que responde por 80% dos acidentes de trabalho (embora ela responda por apenas 25% das vagas existentes) e 90% das pessoas resgatadas de grandes casos de trabalho escravo no país. Em resumo, os opositores dessa prática afirmam que, com a terceirização, os trabalhadores seriam os maiores prejudicados.
Quem é contra e quem é a favor?
Como já mencionamos, são contrários à lei da terceirização os grupos de esquerda e boa parte das centrais sindicais, tais como a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a Central dos Trabalhadores do Brasil (CTB). Dessas centrais, apenas a Força Sindical é favorável ao projeto. Algumas instituições e organizações de direita também assumiram posição contrária ao projeto, embora em minoria.
O governo federal também é contra a PL 4.330 e a tendência é de que a presidenta Dilma Rousseff vete o projeto caso ele chegue à sua mesa para sanção presidencial. Em termos partidários, PT, PC do B e PSOL votaram maciçamente contra a proposta, enquanto DEM, PMDB, PP, PSB, PR, PROS, SD, PSD, PSDB e outros votaram a favor, embora esse último partido citado tenha recuado após a repercussão do tema.
O tema da terceirização no Enem
A prova do Enem dificilmente cobrará o tema da terceirização de forma isolada ou com apelos políticos. A tendência é a de que, se o assunto cair, ele apareça como uma forma de contextualização de abordagens sobre o atual processo de flexibilização do trabalho e as transformações nas atividades industrial e trabalhista.
Por isso, o candidato deve inteirar-se sobre a atual fase do sistema capitalista e o processo de globalização, que, entre outras questões, intensificou a fragmentação produtiva e a ligeira desregulamentação do trabalho, além do relativo enfraquecimento dos sindicatos em todo o mundo. Não obstante, é preciso estar por dentro de questões sobre o sistema Toyotista de produção e o regime de Acumulação Flexível, que têm em suas características o aumento dos processos de terceirização e terciarização (expansão do setor terciário: comércio e serviços).