Impeachment de Dilma Rousseff

O Impeachment de Dilma Rousseff foi um dos acontecimentos recentes mais importantes do Brasil, do ponto de vista político, e precisa ser estudado desde já.
Por Cláudio Fernandes

Dilma Rousseff no Senado Federal, em 29 de agosto de 2016 *
Dilma Rousseff no Senado Federal, em 29 de agosto de 2016 *
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Em 31 de agosto de 2016, a presidente do Brasil, Dilma Vana Rousseff, foi destituída do cargo após a conclusão de um processo de impeachment, aberto contra ela em 12 de maio do mesmo ano. Entretanto, Dilma Rousseff não perdeu seus direitos políticos com a destituição, isto é, não ficou inabilitada para exercer cargos públicos por um período de oito anos, como prevê a Constituição Federal em seu artigo 52. Neste texto, além de explicarmos como ocorreu esse acontecimento, também indicaremos alguns temas históricos correlatos que podem ser alvos de questões de vestibulares e do Enem nos próximos anos.

  • Acolhimento do pedido de impeachment na Câmara dos Deputados

Ao longo do ano de 2015, a Câmara dos Deputados, então presidida pelo deputado Eduardo Cunha (PMDB), recebeu 50 pedidos de impeachment contra a presidente Dilma Rousseff. Desses pedidos, 39 foram rejeitados por não apresentarem provas e argumentos satisfatórios. Dos 11 restantes, Eduardo Cunha acolheu, em 2 de dezembro, aquele que foi protocolado em 15 de outubro. Esse pedido foi elaborado pelos juristas Miguel Reale Jr., Janaína Conceição Paschoal e Hélio Bicudo e subscrito por três líderes de movimentos populares que articularam parte da massa de pessoas que foi para as ruas em várias cidades do país em 2015, sobretudo em 15 de março. São eles: Kim Patroca Kataguiri (Movimento Brasil Livre – MBL), Rogério Chequer (Vem Pra Rua) e Carla Zambelli Salgado (Movimento Contra a Corrupção).

  • Abertura do processo e afastamento da presidente

O pedido foi encaminhado ao plenário da Câmara para ser votada a sua admissibilidade. A votação ocorreu no dia 17 de abril de 2016. 367 deputados federais foram favoráveis e 137 votaram contra. Aos doze dias do mês seguinte, foi a vez de o plenário do Senado Federal votar contra ou favor da abertura do processo de impeachment. 55 senadores votaram a favor e 22, contra. Sendo assim, o processo estava oficialmente em curso e, como previsto no texto constitucional, Dilma Rousseff teve que se afastar temporariamente do cargo. Seu vice, Michel Temer, assumiu interinamente o posto.

  • Argumentos da acusação e da defesa

Segundo a Constituição Federal do Brasil, durante o processo de impeachment, os senadores desempenham função de juízes. Portanto, foi montada uma Comissão Especial de Impeachment para apurar as denúncias do processo, ouvir testemunhas da acusação e da defesa e debater política e juridicamente o caso.

No pedido que foi acolhido, os denunciantes formularam a acusação de crime de responsabilidade contra a presidente Dilma com base no artigo 85 da Constituição Federal e Lei 1. 079/1050. O argumento principal dizia respeito à violação, por parte da presidente, de leis relativas ao orçamento e ao controle fiscal, como a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Essa violação teria sido cometida com a edição de decretos de créditos suplementares sem a aprovação do Congresso Nacional e a realização de operação de crédito com instituição financeira controlada pela União.

A defesa, que foi realizada pelo advogado José Eduardo Cardozo, bem como os senadores partidários da presidente, justificou que a edição dos decretos consistia apenas em autorização de gastos, sem impacto na realização da despesa, já que esta seria “controlada pelos decretos de contingenciamento. Quanto a esse aspecto, no ano de 2015, o governo teria promovido o maior contingenciamento da história e cumprido a meta vigente ao final do exercício”. [1] Além disso, a defesa também argumentou que toda a realização do processo de impeachment não tinha legitimidade porque não havia crime algum cometido por Dilma Rousseff. Fez parte desse argumento a narrativa de que o processo, na verdade, era um “golpe parlamentar”, orquestrado por alguns personagens da cena política, como Eduardo Cunha e Michel Temer.

  • Votação final

Finalizados os trâmites da Comissão Especial de Impeachment, o processo seguiu para sua fase final, que transcorreu durante os dias 29, 30 e 31 de agosto de 2016. No primeiro dia, a presidente Dilma foi ao plenário do Senado Federal fazer a sua defesa e responder aos questionamentos dos senadores. Depois, acusação e defesa fizeram seus discursos finais, seguidos pelos discursos, também finais, dos senadores contra e a favor do impeachment. No dia 31, houve a votação decisiva.

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Todavia, antes que tivesse início, o primeiro-secretário do Senado, senador Vicentinho Alves, apresentou um requerimento da bancada do Partido dos Trabalhadores (PT) – partido da Presidente da República – que pedia o destaque do texto da votação que fala da penalidade aplicada ao presidente que sofre impeachment. O texto integral prevê a destituição do cargo e a perda dos direitos políticos, isto é, a inabilitação para o exercício de funções públicas, por oito anos. O requerimento pedia que ocorressem duas votações, uma para cada quesito da sentença. Os senadores votariam: 1) a favor ou contra a perda do mandato da presidente e 2) a favor ou contra a perda dos direitos políticos.

O requerimento foi deferido pelo presidente da mesa do julgamento, que era, na ocasião, o ministro e presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski. Ocorreram, então, duas votações e a presidente foi destituída de seu posto (primeira votação), mas ficou com os seus direitos políticos preservados (segunda votação). Esse “fatiamento” do texto da pena gerou intensa discussão entre juristas, políticos e jornalistas, já que foi considerado inconstitucional por muitos.

  • O que pode ser explorado no Enem e Vestibulares

Como foi um acontecimento de grande impacto, o impeachment de Dilma Rousseff certamente será abordado, no futuro, em Vestibulares e no Enem. Para este ano de 2016, é provável que apareçam, sobretudo no Enem, não questões diretamente relacionadas com esse fato – já que ainda é muito recente –, mas correlatas a ele, isto é, no Brasil, já tivemos, além desse envolvendo Dilma Rousseff, dois pedidos de impeachment que foram acolhidos na Câmara dos Deputados e submetidos à admissibilidade no plenário.

O primeiro foi protocolado pela União Democrática Nacional (UDN), em maio de 1954, contra Getúlio Vargas. O pedido foi acolhido e votado em junho. 136 deputados federais rejeitaram o pedido, 35 votaram favoravelmente e 40 não votaram nem a favor nem contra. O segundo foi protocolado por Marcello Lavenère e Barbosa Lima Sobrinho, no dia 3 de setembro de 1992, contra Fernando Collor de Mello. O pedido também acusava Collor de ter cometidos crimes de responsabilidade, previstos no artigo 85 da Constituição de 1988 e na lei 1.079, de 1950 – a mesma acusação feita contra Dilma, entretanto, em circunstâncias diversas, que podem ser mais bem exploradas aqui.

Esses dois casos podem ser objeto de questões que podem requerer conhecimentos sobre o contexto político de cada época. No caso de Vargas, por exemplo, houve o livramento do impeachment, mas as circunstâncias políticas levaram-no ao suicídio em agosto de 1954.

Uma dica importante é estudar também o desempenho que cada vice-presidente teve ao assumir o posto em cada casa citado acima. No primeiro caso (Vargas), o vice a assumir foi Café Filho; no segundo (Collor), Itamar Franco.

Outro caso importante que pode ser cobrado em questões é o de Fernando Lugo, que, quando presidente do Paraguai, sofreu um processo de impeachment em 2012. Muitas crises políticas levaram chefes de Estado da América do Sul à renúncia e à fuga, mas o caso de Fernando Lugo, fora os que ocorreram no Brasil, é o único em que também houve (um polêmico) processo de impeachment que se concretizou, terminando com a sua destituição.

NOTAS

[1] ANASTASIA, Antônio. Parecer sobre a Comissão Especial do Impeachment. p. 258.

* Créditos da imagem: Agência Senado Federal