Comissão inédita vai revisar questões do Banco de Itens do Enem
Um dos membros da comissão já criticou ideologia de gênero e acusou universidades de promoverem "esquerdismo".
Nesta quarta-feira, 20 de março, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) anunciou a criação de uma comissão para analisar as questões do Banco Nacional de Itens do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). A medida foi publicada no Diário Oficial da União.
Segundo nota enviada pelo Inep, o objetivo da comissão é “analisar as questões para verificar sua pertinência com a realidade social, de modo a assegurar um perfil consensual do exame”. Questionado sobre o que seria esta “pertinência com a realidade social”, o Inep respondeu que não poderia esclarecer nada além da nota divulgada.
Três membros farão parte da comissão:
- Marco Antônio Barroso Faria: secretário de Regulação e Supervisão da Educação Superior do Ministério da Educação (MEC). Barroso Faria é formado em Filosofia e foi orientado pelo ministro Ricardo Vélez no mestrado e doutorado na Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF).
- Antônio Maurício Castanheira das Neves: diretor de Estudos Educacionais do Inep. Antônio é psicólogo e doutor em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).
- Gilberto Callado de Oliveira: procurador de Justiça do Ministério Público de Santa Catarina, vai atuar na comissão como um representante da sociedade civil. Gilberto Callado já deu entrevista criticando a “contaminação ideológica esquerdista nas universidades brasileiras” e a “ideologia de gênero”.
A comissão ficará responsável por ler os itens e recomendar ou não a utilização no Enem 2019. O diretor de Avaliação da Educação Básica emitirá contra parecer para cada um dos itens não recomendados pela comissão. Se houver discordância entre o diretor e a comissão, cabe ao INEP a decisão final, por meio do presidente Marcus Vinicius Rodrigues.
A comissão terá dez dias para a conclusão dos trabalhos, pois as questões do Enem, geralmente, são escolhidas até abril. O edital do Enem 2019 deve sair até o final de março.
Sigilo
Todos os membros da comissão assinarão um Termo de Compromisso de Confidencialidade e Sigilo e não poderão se pronunciar sobre o trabalho. Também não será publicado nenhum relatório. O Banco Nacional de Itens está localizado no Ambiente Físico Integrado Seguro, na sede do Inep, e só pode ser acessado por pessoas autorizadas.
Como é elaborada a prova do Enem
A elaboração das questões que compõem o Banco Nacional de Itens começa com a contratação e capacitação de colaboradores das quatro áreas de conhecimento do Enem: Linguagens e Códigos; Matemática; Ciências Humanas; e Ciências da Natureza.
Os colaboradores elaboram as questões e um revisor técnico do Inep revisa o que foi proposto e analisa se há necessidade de modificações. Na sequência, especialistas das áreas do conhecimento autorizam ou reprovam o conteúdo.
Veja um passo a passo da elaboração da prova do Enem
Todas as questões aprovadas por especialistas passam por um pré-teste antes de compor o Banco de Itens. As questões são testadas por estudantes do ensino médio de escolas públicas, sem eles saberem do que se tratam.
O pré-teste é sigiloso e avalia a dificuldade de cada questão, o preparo dos estudantes e a probabilidade de acerto em caso de chute. Se aprovada, a questão vai para o Banco Nacional de Itens. Como o processo é demorado, as questões, geralmente, são usadas somente em edições futuras do Enem.
Censura
Esta é a primeira vez que o Banco Nacional de Itens passa por uma revisão de uma comissão, o que pode ser encarado como censura por profissionais da área de educação. Em novembro, depois da aplicação do Enem 2018, o presidente Jair Bolsonaro criticou uma questão que citava o pujubá, dialeto secreto de gays e travestis. A questão não cobrava conhecimento sobre o pajubá, mas apenas o que o caracterizava como um dialeto.
Bolsonaro afirmou que a intenção do seu governo é “fazer com que o Enem cobre conhecimentos úteis” e manifestou o desejo de ver a prova do Enem assim que ela ficar pronta. Desde a criação do Enem, em 1998, nenhum presidente teve acesso à prova antes da aplicação.