No dia 11 de janeiro de 2014 morreu Ariel Sharon após ficar oito anos em estado vegetativo em decorrência de um derrame sofrido em 2006. Militar e político israelense, a vida de Sharon esteve intimamente ligada à história do Estado de Israel e, consequentemente, à Questão Palestina. Por isso, seu legado foi extremamente controverso, gerando reações de amor e ódio durante sua vida e após sua morte.
Ariel Sharon (apelidado de Bulldozer, o Trator) nasceu em 1928 em um assentamento judeu na Palestina, quando a região era ainda administrada pela Grã-Bretanha. Filho de judeus bielo-russos, desde a juventude se envolveu na luta pela criação de um Estado judaico na região. Participou ativamente da organização paramilitar Haganah, lutando na guerra árabe-israelense entre 1948 e 1949 após a criação do Estado de Israel. O Haganah foi um dos embriões do exército israelense, do qual Ariel Sharon foi um dos fundadores.
Ariel Sharon foi considerado um herói de guerra israelense por participar de diversos enfrentamentos com os países vizinhos de Israel. Além da guerra acima citada, esteve presente na Guerra do Suez, na Guerra dos Seis Dias e na Guerra do Yom Kippur, por exemplo. Essas guerras ampliaram o território israelense, resultando ainda em ocupações de áreas pertencentes aos palestinos, como a Faixa de Gaza, Jerusalém e a Cisjordânia.
Sharon era conhecido pela dureza no tratamento dos inimigos e também pela insubordinação em relação aos seus superiores. Essas características foram geralmente invocadas para explicar, em parte, a execução de alguns massacres sobre populações palestinas.
Em 1953, à frente da chamada Unidade 101 — uma força especial do exército israelense destinada a combater guerrilheiros palestinos (os fedayeen) —, Sharon ordenou a explosão de 50 casas no vilarejo de Qibya, resultando na morte de 69 pessoas, sendo a maioria mulheres e crianças. Diversas autoridades internacionais condenaram o ataque à época. Entretanto, nenhum oficial israelense foi condenado pelo massacre.
Quase trinta anos depois, outros dois massacres a palestinos ocorreram sobre responsabilidade de Ariel Sharon. Como Ministro da Defesa israelense, Sharon ordenou a invasão do sul do Líbano, em 1982, com o objetivo de expulsar os militantes da Organização para a Libertação da Palestina (OLP) da região, principalmente o líder da OLP, Yasser Arafat. O país vizinho a Israel estava em guerra civil entre cristãos e muçulmanos.
Cerca de 14 mil militantes da OLP foram expulsos, mas havia ainda nas cercanias da cidade libanesa, Beirute, dois campos de refugiados palestinos: Sabra e Shatila. Após o assassinato do presidente cristão Bachir Gemayel (que considerava os palestinos no Líbano como “população excedente”), uma milícia formada por seus seguidores foi autorizada pelas forças israelenses que ocupavam a região a invadir os campos de refugiados. O resultado foi o assassinato de cerca de 3,5 mil palestinos. A ONU declarou os massacres como um genocídio.
Os chamados massacres de Sabra e Shatila fizeram com que Ariel Sharon fosse julgado pela Corte Suprema de Israel e condenado, em 1983, por sua responsabilidade pessoal nos massacres, já que os campos de refugiados estavam sob o comando do exército israelense, que não tomou as medidas de seguranças necessárias para garantir a vida dos refugiados. Ariel Sharon foi afastado do cargo de Ministro da Defesa, mas não da vida política.
Soldados israelenses em frente ao muro que separa Israel da Cisjordânia, com grafite que retrata o líder palestino Yasser Arafat.**
Na década de 1970, Sharon participou da fundação do Likud, um dos principais partidos da direita israelense. Ele exerceu mandatos parlamentares desde a década de 1970, ocupando ainda postos ministeriais em diversos governos, como o de Ministro da Agricultura e da Habitação. Nesses postos, é de se destacar a sua política de construção de assentamentos de judeus em territórios palestinos, principalmente na Faixa de Gaza e na Cisjordânia, após a década de 1990. Essa política ampliou os territórios israelenses ao maior nível desde a Guerra dos Seis Dias, de 1967. Tais assentamentos são considerados irregulares e ilegais até hoje, sendo fonte de constantes conflitos entre israelenses e palestinos.
O ponto alto da vida política de Ariel Sharon ocorreu na primeira metade da década de 2000. Como líder do Likud, Sharon realizou uma visita à Esplanada das Mesquitas (ou Monte do Templo, para os judeus), na cidade de Jerusalém, em 2000. A visita ao local sagrado para os muçulmanos gerou uma onda de revoltas entre os palestinos, no processo que ficou conhecido como Segunda Intifada (revolta) Palestina. A Segunda Intifada resultou em uma série de ataques palestinos a Israel, com mísseis lançados no território israelense ou através de atos terroristas.
A ação palestina serviu como mote de campanha eleitoral para Sharon, prometendo alcançar “segurança e paz verdadeira”. Com uma vitória eleitoral esmagadora, Ariel Sharon tornou-se primeiro-ministro de Israel, em 2001.
Seu mandato foi marcado por inúmeros fatos. O combate militar à Segunda Intifada e o cerco à OLP nos territórios palestinos merecem destaque. O cerco ao quartel-general de Yasser Arafat, em Ramallah, isolou o líder da OLP até sua morte, em 2004, sob fortes suspeitas de envenenamento.
Foi também sob o governo de Ariel Sharon que foi iniciada a construção de um imenso muro (semelhante ao Muro de Berlim) que separa territórios sob comando israelense da Cisjordânia, controlada pela Autoridade Nacional Palestina (ANP). O objetivo era evitar que terroristas adentrassem o Estado de Israel e cometessem atos contra a população do país.
Protesto de israelenses contra a retirada dos colonos da Faixa de Gaza.***
Por outro lado, Ariel Sharon é defendido por ter realizado a retirada unilateral de colonos israelenses da Faixa de Gaza, além da remoção de quatro assentamentos na Cisjordânia, em 2005. A medida teria por suposto objetivo conter as ações da Segunda Intifada. Entretanto, foi evocada a insustentabilidade da manutenção da segurança dos colonos na Faixa de Gaza em virtude dos altos custos para manter uma população de cerca de 9 mil israelenses entre 1,5 milhão de palestinos. Pode-se argumentar ainda que, com a medida, Ariel Sharon congelou as negociações de paz com os palestinos, já que seria uma concessão israelense sem uma contrapartida. Dessa forma, a ação de Sharon poderia conter a consolidação do Estado Palestino.
Tais medidas geraram uma oposição da direita à Ariel Sharon. Como consequência, ele formou um novo partido, o Kadima, após sua saída do Likud. Sua intenção era tentar a reeleição. Entretanto, um derrame em janeiro de 2006 tirou-o da vida política. Sharon ficou em estado vegetativo por oito anos, morrendo em 11 de janeiro de 2014. Várias manifestações ocorreram após sua morte. Seus apoiadores defenderam o legado do chamado “Rei de Israel”, em contrapartida, seus opositores comemoraram a morte de uma pessoa que eles consideraram como um criminoso de guerra impune.
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** Crédito da Imagem: Ryan Rodrick Beiler e Shutterstock.com
*** Crédito da Imagem: Nola Rin e Shutterstock.com