Processo abalado: o ensino e aprendizagem em tempos pandêmicos

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Dados do Ministério da Educação indicam os primeiros resultados da realidade pandêmica de estudantes do ensino médio brasileiro.

O ensino remoto permitiu a continuidade dos estudos na pandemia, porém intensificou as desigualdades no Brasil.
Crédito da Imagem: Shutterstock / Westock Productions

São mais de dois anos que o mundo convive com a realidade pandêmica causada pela Covid-19. Nesse período, sofremos impactos significativos e que ainda continuarão a ser sentidos por muito tempo. Entre os setores sociais afetados está a educação, uma das áreas que foram intensamente atingidas com as restrições de controle de disseminação do coronavírus

Com as medidas de prevenção à Covid-19, as escolas tiveram de fechar as portas. O processo de ensino passou a ser redimensionado e, com isso, grandes desafios tiveram de ser enfrentados pelos vários sujeitos envolvidos na história: estudantes e suas famílias, os professores, coordenadores, diretores escolares e os gestores públicos.

Os desafios se complexificam quando se vive em um país desigual como é o Brasil. A vulnerabilidade social vivenciada por milhões de brasileiros fragilizou ainda mais o processo de ensino e aprendizagem quando foi necessário utilizar ferramentas tecnológicas para possibilitar a continuidade das aulas. A grande maioria dos centros educacionais não estavam preparados para essa demanda, tampouco os estudantes que vivem em situação de pobreza.

Marcas da pandemia

Um estudo do Fundo de Emergência Internacional das Nações Unidas para a Infância (Unicef) evidenciou as marcas deixadas pela pandemia no seu primeiro ano, em 2020. A pesquisa revelou que cerca de 1,38 milhão de estudantes entre 6 e 17 anos abandonaram as escolas. Foram 4,12 milhões que não tiveram acesso às atividades escolares justamente por elas estarem ocorrendo no formato remoto.

Além das problemáticas sociais como a evasão escolar e a desigualdade, as questões da aprendizagem em si devem ser consideradas, uma vez que muitos tiveram dificuldade no processo de adaptação do ensino remoto.

Um levantamento feito pela Associação Brasileira de Educação a Distância (ABED) mostra que 67% dos estudantes sentem dificuldade na organização de uma rotina de estudos em casa. 

Leia também: Ensino remoto e Covid-19: as maiores dificuldades dos estudantes na pandemia

Diante de uma falta de organização, planejamento e de recursos adequados, a qualidade do ensino foi diretamente afetada. Somado aos problemas relacionados à desigualdade, os resultados desse percurso trazem consequências e impactos significativos que produzem uma lacuna na educação brasileira e mundial.

Impacto na educação em números

No último dia 19, o Ministério da Educação (MEC) realizou o I Fórum de Discussão de Resultados das Avaliações Diagnósticas e Formativas com o objetivo de divulgar os dados de testes realizados por estudantes da educação básica (fundamental e médio) para medir os impactos da pandemia. Ao todo, foram mais de 3,2 milhões de participantes em todos os níveis de ensino. 

No ensino médio, mais de 300 mil realizaram os testes, que foram formados por questões de matemática e português. As questões avaliaram habilidades específicas e básicas das duas disciplinas. Os dados são alarmantes e evidenciam o que muitos já esperavam.

Veja abaixo algumas das habilidades verificadas seguidas do percentual de acertos:

Língua Portuguesa:

  • Sentido das relações lógico-discursivas em um texto: 30%
  • Identificar a finalidade de textos de diferentes gêneros: 48%
  • Distinguir fato da opinião: 50%

Matemática:

  • Identificar triângulos semelhantes entre si: 10%
  • Cálculos de média, mediana e moda: 18%
  • Cálculos simples com números decimais: 27%

Os resultados evidenciam o fato de que esses estudantes estão com dificuldades de resolver problemas e situações que são básicas e essenciais para essa fase de ensino. Ou seja, o baixo nível de acertos nos testes feitos pelo MEC é considerado um forte indicador do quanto a pandemia afetou o processo de ensino e aprendizagem. 

Nos últimos três anos tivemos os menores orçamentos destinados à educação no Brasil desde 2000, segundo estudo do Observatório do Legislativo Brasileiro (OLB), da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Período que coincide com a pandemia de Covid-19.

Os repasses do governo Bolsonaro para o setor da educação evidenciam um descompromisso desta gestão em relação à área.

A educação é uma possibilidade concreta de desenvolvimento em diversas esferas: social, cultural, econômica e política. Já dizia Paulo Freire "se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda".

Em tempos de incertezas e instabilidades, o olhar para a educação deve ser cada vez mais cuidadoso e necessário. É a partir dela que se produz ciência, setor essencial no enfrentamento da pandemia, bem como outras demandas fundamentais para a humanidade.