Uma prosa de duas décadas
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Com a sociedade dividida, a proposta de Redução da Maioridade Penal já tramita no congresso há mais de 20 anos.
A morte de um ciclista na Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro, reacendeu o debate sobre a redução da maioridade penal no Brasil. Um menor, de 16 anos, teria esfaqueado o médico Jaime Gold, mesmo sem reação da vítima ao assalto. O fato gerou grande revolta nas redes sociais e deu ainda mais razões para que militantes da causa pedissem a mudança na Constituição.
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC 171/1993) tramita no congresso desde agosto de 1993 e reduz de 18 para 16 anos a idade mínima para que o indivíduo responda criminalmente por seus atos, além de quase 40 apensados sobre o tema. Em mais de 20 anos de processo a PEC da Maioridade já recebeu algumas emendas, mas não passou das comissões da casa.
Tanto tempo de discussão só reflete a polêmica que envolve o tema. Enquanto alguns parlamentares questionam a constitucionalidade da proposta, outros acreditam que a aprovação da emenda não modificaria as “Cláusulas pétreas” previstas no artigo 60 da Constituição Federal. Aí reside a primeira parte do debate, a PEC 171/1993 seria ou não inconstitucional? Com base nisso, as discussões no Congresso são sempre acompanhadas por dois juristas que se posicionam de formas divergentes.
No entanto, ser ou não constitucional é apenas o início de uma série de argumentos que podem ser elencados a partir da realidade brasileira. A primeira questão é que, mesmo não sendo junto ao sistema carcerário os adolescentes, maiores de 12 anos já estão passíveis de punição a partir de medidas socioeducativas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA).
Outra problemática é sobre a falibilidade do sistema carcerário brasileiro que conta com mais de 200 mil presos excedentes a sua capacidade. Além de cadeias e penitenciárias com lotação de aproximadamente 160%, as celas das delegacias também estão sobrecarregadas.
Especialistas acreditam que a solução estaria na otimização das medidas prevista no ECA, além da resolução dos crimes com o julgamento dos acusados. Segundo o Conselho Nacional de Justiça, no final de 2014, 32% dos encarcerados eram presos provisórios que ainda aguardavam julgamento. Com o terceiro maior número de presidiários do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos e da China, o Brasil ainda precisa rever muitas coisas para chamar as prisões de sistema penal.
Em contrapartida a certeza da impunidade entre os adolescentes pode colaborar para o aumento da criminalidade. O caso citado no início do texto não está isolado, outras formas de crimes, por vezes hediondos, são cometidos por menores de idade. É preciso pesar também o uso de menores como “aviõezinhos” para o tráfico de drogas, por exemplo, onde um adulto usa da inimputabilidade de adolescentes para cometer crimes.
Em março de 2015, a proposta foi aprovada na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara (CCJ) e deve passar ainda por uma Comissão Especial antes de ir a plenário. Apesar disso, instituições como Unicef, OAB, Ministério Público Federal e a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República se manifestaram contrárias ao projeto.
E lá se vão 22 anos de discussões, emendas, protestos, presídios lotados e menores cometendo crimes. Ainda não há consenso, portanto não há também solução aparente. A discussão continua.