Projetos ajudam pessoas LGBT+ a concluírem o ensino médio e entrar na faculdade

O Dia Internacional contra a LGBTfobia levanta pautas como a importância da garantia da cidadania e qualidade de vida por meio da educação.
Em 17/05/2022 09h23 , atualizado em 17/05/2022 11h41 Por Lucas Afonso

Estudante com bandeira LGBT
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Hoje, 17 de maio, é celebrado o Dia Internacional contra a LGBTfobia. O reconhecimento é referência ao dia em que a Organização Mundial da Saúde (OMS) retirou a homossexualidade da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde (CID), em 1990. 

A data reforça a importância da luta contra as violências físicas e simbólicas que marcam os corpos LGBTs (lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros). Diante de uma realidade que impede essas pessoas de acessarem espaços de formação, de mercado de trabalho e de lazer, é fundamental a promoção de iniciativas que visam a garantia de direitos básicos como é o caso da educação. 

Leia: O que são cisgênero e transgênero?

A evasão escolar é uma realidade vivenciada por muitas pessoas dessa comunidade, e uma de suas principais causas é justamente a LGBTfobia. A formação escolar é uma possibilidade concreta das pessoas LGBTs ampliarem as alternativas para ingresso no mercado de trabalho, bem como garantir qualidade de vida.

No Brasil, existem iniciativas que são destinadas ao atendimento da comunidade LGBT quanto ao desenvolvimento educacional em atividades como: auxílio no processo de preparação para o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) e vestibulares; suporte nos estudos em níveis fundamental e médio, bem como o repasse de bolsas para ajudar na continuidade dos estudos.

Leia também: Trans e travestis nas universidades: o difícil acesso ao ensino superior no Brasil

Projetos educacionais para LGBTs

Conheça diferentes projetos destinados ao atendimento e acolhimento de pessoas LGBTs no Brasil:

Transcidadania

O programa Transcidadania é uma iniciativa da Secretaria Municipal de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo (SMDHC) com objetivo de promover a reintegração social e o resgate de cidadania de travestis, mulheres e homens trans em situação de vulnerabilidade.

De acordo com Cássio Rodrigo de Oliveira, coordenador de políticas LGBT da SMDHC, o programa é voltado para a elevação de escolaridade tanto do nível fundamental quanto do médio, como também na promoção de empregabilidade para as e os participantes, uma vez que a iniciativa possui parceria com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae) com a possibilidade de oferta de cursos profissionalizantes.

O projeto oferece bolsas mensais por até dois anos no valor de R$1.272,60. O auxílio da bolsa visa o suporte no processo de dedicação aos estudos, viabilizando os custos com o transporte, por exemplo. 

Atualmente, são 510 pessoas contempladas com as bolsas do Transcidadania. Em julho deste ano estão previstas mais 150 vagas para a participação no programa, totalizando 660 beneficiários(as). 

Durante a pandemia, com o ensino remoto, as e os participantes do projeto tiveram o suporte de profissionais da Pedagogia nos Centros de Cidadania no reforço escolar e auxílio durante o processo de adaptação ao formato de ensino a distância, relatou Cássio Rodrigo. 

Para as e os concluintes do ensino médio, há um trabalho de suporte específico dos pedagogos do programa no sentido de preparar os participantes para os processos seletivos de ingresso ao ensino superior. O programa também conta com parceria com cursinhos preparatórios.

Participantes do Transcidadania em atividade cultural e roda de conversa.
Crédito: Reprodução / Secretaria Especial de Comunicação de São Paulo

Entre os parceiros do Transcidadania, estão a Secretaria de Desenvolvimento Econômico e Trabalho de São Paulo, que promove mutirões de empregos destinados a pessoas trans e travestis oriundas(os) do projeto. 

A Defensoria Pública do Estado de São Paulo conta com uma cláusula nos editais de chamamento dos serviços terceirizados que destina, no mínimo, 10% das vagas para travestis e mulheres transexuais em situação de vulnerabilidade oriundas do Transcidadania, bem como a mulheres vítimas de violência. São ofertadas oportunidades de serviço nas áreas de telefonia, recepção, limpeza e transporte para todo o estado de São Paulo.

A assistente social Renata Peron foi uma das beneficiárias da iniciativa quando o Transcidadania se chamava Programa Operação Trabalho LGBT (POT). A participação de seis meses no POT lhe proporcionou ter uma renda e poder continuar em São Paulo e, logo após o projeto, poder trabalhar na SP Escola de Teatro, relatou Renata. 

"O projeto Transcidadania é um divisor de águas na vida de uma trans, pois ela não costuma ter perspectiva de vida. Quando ela tem um programa que possibilita estudar e ganhar para estudar, ela passa a ter sonhos e poder realizá-los."

Renata Peron

Renata Peron se formou em Serviço Social pela Universidade Nove de Julho (Uninove) e atualmente trabalha na Secretaria Municipal de Esportes e Lazer da cidade de São Paulo como diretora de Divisão Técnica. A assistente social defende que políticas públicas como o Transcidadania estejam presentes nas demais regiões brasileiras e que não se constituam apenas enquanto políticas municipais, mas também em âmbitos estaduais e nacional.

Saiba mais sobre o Transcidadania nesta página

CasaNem

O CasaNem é um centro de acolhimento de pessoas LGBTs em situação de vulnerabilidade no Rio de Janeiro. Entre os serviços ofertados pela iniciativa estão a distribuição de cestas básicas e a promoção de cursos de qualificação profissional em prol de garantir empregabilidade a pessoas da comunidade LGBT. 

O projeto conta também com o curso PreparaNem que objetiva possibilitar uma preparação adequada para o ingresso ao ensino superior, em testes de vagas de emprego e oportunizar formação em escrita e oratória, de acordo com a ex-participante da iniciativa Luana Rayalla que é formada em Biblioteconomia pela Universidade Federal Fluminense (UFF).

As aulas acontecem de segunda a sexta, a partir das 18h. 

Conheça mais do projeto na página do Instagram do CasaNem

Tô Passada

O Tô Passada é um cursinho preparatório para o Enem que atende pessoas da comunidade LGBT em Uberlândia (MG) e região.

A ex-participante e atual membro da coordenação do projeto, Giovanna Peixoto, disse que o objetivo do curso é levar a oportunidade para pessoas LGBTs de poderem ingressar no ensino superior por meio de educação gratuita e de qualidade.

O projeto está em seu terceiro ano de funcionamento e abre 40 vagas ao ano para qualquer pessoa que pertença à comunidade LGBT+. As aulas acontecem de segunda à sexta, das 19h às 21h55.

Saiba mais sobre o cursinho na página do Instagram do Tô Passada.

Transvest

O Transvest é uma Organização Não Governamental (ONG) de Belo Horizonte que trabalha em prol da reintegração de transexuais e travestis à sociedade por meio da educação. A vereadora Duda Salabert foi a idealizadora e fundadadora da iniciativa.

Thiago Coacci, coloborador do Transvest, contou que o projeto atende pessoas travestis e trans que desejam concluir o ensino fundamental e o ensino médio. As aulas são gratuitas e focadas na avaliação do Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos (Encceja). Há também auxílio para a preparação para o Enem. 

As aulas acontecem presencialmente de segunda a sexta-feira, das 13h às 17h.  A oferta é de 35 vagas por semestre.

Confira a página do Instagram do Transvest.

Leia também: Estudantes trans encontram em cursinhos LGBT o apoio para ingressar na faculdade

Combate à LGBTfobia

O 17 de maio é uma data que simboliza a resistência e conscientiza a sociedade acerca dos danos causados pela LGBTfobia e a importância da mobilização coletiva em prol da redução dos casos de violência que acometem pessoas dessa comunidade.

Há 42 anos o Grupo Gay da Bahia produz o Relatório Anual de Mortes LGBTI+ no Brasil, que faz um levantamento sobre um panorama nacional das mortes violentas de pessoas da comunidade LGBT. 

Somente em 2021 foram 300 vítimas, sendo 276 homicídios e 24 suicídios. O cenário coloca o país no primeiro lugar do ranking mundial onde mais se matam pessoas dessa comunidade, uma morte a cada 29 horas.

A criminalização da LGBTfobia foi enquadrada na legislação brasileira em 13 de junho de 2019 pelo Supremo Tribunal Federal (STF) após um longo processo de mobilização de movimentos sociais. O crime foi incluído no tipo penal definido na Lei do Racismo (Lei 7.716/1989). São 42 países, além do Brasil, integrantes da Organização das Nações Unidas (ONU) que contam com legislações de proteção aos direitos das pessoas LGBT.

Entretanto, as vítimas de violências LGBTfóbicas encontram uma série de dificuldades ao acessar os serviços de proteção na caracterização da denúncia enquanto LGBTfobia como a invisibilização por parte das próprias instituições como a polícia. Esse fato provoca casos subnotificados e dados estatísticos que não compreendem a realidade.